Crítica: Os Olhos Amarelos dos Crocodilos
Por Gabriel Antoniolli
Primeira cena (ou uma das primeiras): um diálogo frio demais. “Se é assim, não volta mais. Vá embora”. “Ok, e quem vai cuidar das minhas plantas?”.
É nesse ritmo que Os Olhos Amarelos dos Crocodilos (2014) começa. Frio, eu achei. Num primeiro momento, inclusive, suspeitei que os atores não eram bons o suficiente para expressarem a dor e a melancolia do momento decisivo de um divórcio. Engano. Mais que isso: retratação de um relacionamento desgastado. Fazia sentido.
Jo (Julie Depardieu), uma das partes do divórcio, não me atraiu de cara. Fria, jeito meio bobo e aparentemente surpresa o tempo todo. Depois me ganhou com sua bondade. É irmã de Iris (Emmanuele Béart), bem casada há não sei quantos anos e com um filho que ela mal liga. Ligar, mesmo, só para dinheiro e fama, como ela mesma chega a assumir em um momento do filme.
(Foto: divulgação)
Logo que Jo se separa, Iris tenta a consolação. Porém, nem dentro de casa Jo tem apoio: sua filha Hortense (Alice Isaaz) praticamente odeia sua mãe, jogando nela toda a culpa pela separação e proclamando palavras de pura raiva e desprezo contra a progenitora. Entendi que seria um momento complicado para uma adolescente de 15 anos, então dei um desconto. A mãe então continua seu trabalho – é pesquisadora e está escrevendo uma tese a respeito da Idade Média. Iris, com suas papilas gustativas sedentas pela fama e pela popularidade, arruma um esquema: usar a tese de Jo para escrever um livro de ficção. Quem escreveria o livro? Jo, claro.
Essa é basicamente a sinopse desse longa francês (em um de seus elencos) que me fez refletir e me emocionar em larga escala, por uma série de fatores.
A brevidade da vida é uma coisa surreal. Nos acostumamos ao que já está acostumado – cotidiano, amigos, família, casa, trabalho, esposa/marido. Esquecemo-nos que um dia as coisas mudam, e mudam mesmo. Por mais leve que seja o tom de Os Olhos Amarelos dos Crocodilos, percebemos o trágico em meio à comédia. percebemos o drama em meio às melosidades. E que toda a efemeridade faz muito mais sentido quando aproveitada da melhor forma possível, o que nem sempre vimos no filme. Receio e falta de atitude nem sempre leva a algum lugar; mentiras e falsas posições também não.
Logo pouco antes do fim, um abraço acalentou a tomada praticamente final. E isso valeu bem. Um abraço ao final sempre melhora as coisas, ainda mais quando é sincero.