Entrevista exclusiva com Fernanda Faran, diretora do espetáculo “No Fim, Viveremos”
Estreou no dia 04 de junho, no Teatro da Confraria, o espetáculo No Fim, Viveremos! do Grupo Ser de Teatro, com direção de Fernanda Faran e no elenco Fabio Dantas, Guilherme Barros, Renata Maria Nogueira, Shirlei Souza e Erica Alves, que também assina a autoria da peça.
No Fim, Viveremos! se passa em um dos períodos mais tristes da nossa história recente, durante a Segunda Guerra Mundial e o auge do regime nazista. Nesse contexto, está inserido a vida de duas irmãs judias que vivem escondidas em um sótão, na esperança de sobreviverem para ver a guerra acabar. O som do rádio e as notícias que leem nos jornais tornam os dias mais frios e cinzentos. A chegada inesperada de alguém traz à tona incertezas e temores de uma guerra que antes acontecia fora das quatro paredes, mas que agora está em todo lugar.
Um dos principais pontos abordados na peça é protagonismo feminino durante a Segunda Guerra Mundial. O espetáculo foi desenvolvido com o intuito de dar visibilidade e fomentar o debate sobre as mulheres que resistiram ao regime nazista, além de apontar a existência de personagens negras, pouco referenciadas durante esse período histórico.
A dramaturgia referida é a primeira peça que parte de uma trilogia de texto intitulada Mulheres no Holocausto, escrita por Erica Alves, entre 2017 e 2019, e finalizada após um longo período de pesquisas sobre a vida de mulheres na época da Segunda Guerra Mundial, especialmente daquelas que viveram em situação de esconderijo. A perspectiva feminina sobre o holocausto e as violências específicas de gênero ocorridas naquela época atraíram a curiosidade e nortearam os estudos de Erica. A presença do feminino em seus textos ocorre de uma percepção que teve sobre a falta de relatos vividos por mulheres durante esse período histórico.
A diretora Fernanda Faran destaca três fatores relevantes da montagem de No Fim, Viveremos!: “primeiramente a importância de dirigir um texto inédito de uma dramaturga jovem e brasileira. Em segundo, pelo texto ser fruto de pesquisa desse grupo feminino cujo tema é a mulher em situação de holocausto. E por último, dar corpo e movimento a essas personagens que por mais que a história seja ficção não significa que elas nunca existiram”.
O espetáculo foi contemplado no Edital de Fomento a Projetos Culturais Descentralizados de Múltiplas Linguagens da Secretaria de Cultura do Município de São Paulo.
Batemos um papo com Fernanda Faran, diretora do espetáculo que revelou bastidores e curiosidades sobre o espetáculo. Confira!
Acesso Cultural: Qual a importância de dirigir uma peça de uma dramaturga brasileira jovem, em um Grupo formado por mulheres?
Fernanda Faran: A importância é realizar essa história mesmo. Fazer essa história sair do papel e ter dimensões físicas e emocionais. Há anos viemos realizando peças de autores (e diretores) homens e mais antigos, “NO FIM, VIVEREMOS!” é um texto novo de uma autora presente, isso fura uma bolha de autores mortos e europeus que há séculos vêm tomando conta de nossos palcos. E outro ponto importante é que o Grupo Ser de Teatro é um grupo formado por mulheres que visa contar histórias do ponto de vista feminino, a pesquisa é feita pelas mulheres do grupo, a produção, a discussão, tudo isso torna tudo muito mais potente.
AC: O espetáculo “No Fim, Viveremos!” se passa durante a segunda Guerra e o regime nazista, que teve sempre sua história contada por homens brancos. Agora na peça temos a história na visão de mulheres. O que muda?
FF: Muda exatamente o ponto de vista, de onde vem a narrativa. Na história são três mulheres com personalidades distintas e conflitantes. Na História sabemos de alguns nomes que passaram por esse período como Olga Benário e a mais conhecida Anne Frank, ambas mulheres brancas, mas em pesquisas de grupo foi descoberto que havia um campo de concentração apenas para mulheres, Ravensbrück na Alemanha – o último campo a ser liberado- onde mulheres negras, ciganas, protestantes eram levadas e pouco ou nada é sabido sobre ele. Na história há uma menina negra que tem sua origem questionada, isso só potencializa o resultado da pesquisa do Grupo. É isso que muda na história, o interesse em saber sobre as mulheres nesse período, tanto as heroínas quanto as que pereceram, todas elas estavam lá.
AC: O que podemos relacionar da peça com a situação que o Brasil e o mundo passa atualmente com guerras e cenas de violência contra grupos de mulheres, negros e gays?
FF: Isso é a até assustador porque enquanto pesquisávamos e também nos ensaios era como se falássemos do Brasil, do mundo atual. Na peça existe o tema do racismo, a violência contra a mulher, o fascismo e também a utopia. A Segunda Guerra Mundial acaba em 1945, mas hoje ,em 2022, passamos e/ou vemos as mesmas atrocidades sendo cometidas contra mulheres, contra negros e não-brancos (veja o genocídio sendo feito contra a população indígena!), toda a homofobia e transfobia, casos de grupos neo-nazistas surgindo e também casos que só se ouviam falar na época da ditadura militar; esses dias sufocaram um homem com problemas cognitivos dentro de um carro policial como uma câmara de gás, método utilizado para extermínio em massa no holocausto…toda a violência policial contra minorias sociais e como um governo com aspirações fascistas pode provocar o retrocesso de uma nação… Enfim, repito, é assustador as semelhanças da história de um tempo passado recente com o tempo de hoje. A humanidade precisa de justiça e reparação, e governantes com propósitos de bem viver para a nação, soa utópico mas, não vejo outra solução.
SERVIÇO:
LOCAL: Teatro da Confraria, (Rua Lopes Oliveira, 585 – Barra Funda). 30 lugares.
DATA: até 25/06 (Sábados, às 20h)
INFORMAÇÕES:11 96374 5125 e https://linktr.ee/gruposerdeteatro
INGRESSOS: R$ 40,00 (inteira) e R$ 20,00 (meia)
VENDAS PELA INTERNET: https://www.sympla.com.br/produtor/gruposerdeteatro
DURAÇÃO: 90 min
CLASSIFICAÇÃO:16 anos