‘Trava Bruta’ estreia no Centro Cultural São Paulo com texto e interpretação de Leonarda Glück
Estreia dia 7 de dezembro, às 21h no Centro Cultural São Paulo, o espetáculo TRAVA BRUTA, manifesto que parte da experiência transexual da autora Leonarda Glück para propor uma ponte e um embate entre o contexto artístico e a conjuntura política e social brasileira atuais no que se refere ao campo da sexualidade. O trabalho marca as comemorações de 25 anos de carreira da artista e também o seu reencontro com o diretor Gustavo Bitencourt.
Com ampla trajetória no campo das artes cênicas brasileiras, Leonarda fundou importantes coletivos nacionais como a Companhia Silenciosa e a Selvática Ações Artísticas e apresentou seus trabalhos em diversos países da Europa e América Latina, esta é a primeira vez que Leonarda aborda exclusivamente a questão da transexualidade em uma de suas criações. O espetáculo é uma espécie de vertiginoso poema cuja principal metáfora reúne o ato de bloquear e impedir a livre movimentação com a capacidade de brutalidade da natureza humana, sua violência e sua incivilidade. “Como é experimentar um corpo que provoca um misto de repulsa e desejo a um só tempo? O que tem a cultura a ver com a transexualidade? Como é ser uma artista trans no Brasil de 2021? Resposta não há, mas ainda há a poesia. E, mesmo que alquebrado, ainda há o teatro”, diz Leonarda.
A artista conta que começou a escrever o texto para a peça em 2018 em Curitiba, sua cidade natal, antes de se radicar em São Paulo. “Me veio uma possível angústia repentina: a de talvez não ter conseguido em outro momento antes escrever tão intimamente sobre o assunto da transexualidade, e seus efeitos na minha mente e na vida social da qual faço parte”, diz Leonarda, que arrastou por meses a tarefa de terminar o texto.
Já em 2019, a montagem foi premiada pelo Centro Cultural São Paulo, integrando a 6ª Mostra de Dramaturgia em Pequenos Formatos da instituição. Após ter sua estreia suspensa por conta da pandemia, o trabalho foi retomado em 2021 e estreará presencialmente na Sala Jardel Filho, onde serão disponibilizados 160 ingressos. Sobre a pandemia, Glück faz questão de frisar: “A gente entrou no modo catástrofe que meio que está até agora. As pessoas trans ficaram ainda mais vulneráveis do que já eram antes. E elas eram muito. São, no Brasil. Física e psicologicamente.”
A direção da obra, que é produzida pela Pomeiro Gestão Cultural, produtora que realiza a gestão dos projetos de Leonarda, ficou a cargo de Gustavo Bitencourt, parceiro de Glück há mais de 20 anos. Juntos os dois já desenvolveram criações em performance, dança e teatro, com destaque para Valsa Nº 6, montagem do texto de Nelson Rodrigues premiada pela Funarte, feita em 2012 na ocasião do centenário do autor.
Quando foi convidado para dirigir o espetáculo, Gustavo Bitencourt ficou com um pouco de medo. “Porque era um texto que falava muito da experiência dela como mulher trans no Brasil. Onde é que eu ia poder contribuir nisso? O que é que eu sei disso? Mas lendo e relendo, e conversando com ela, fui vendo o quanto esse texto também fala de muitas coisas que dizem respeito a todo mundo, e que era importante que a gente olhasse tanto pro que tem de específico nesse contexto do qual ela fala, quanto pra onde essa história se conecta com outras tantas”. Partindo daí, ele conta que foram entendendo o texto de Trava Bruta como um jeito de falar de coisas que são reais e concretas e nem por isso menos ficcionais.
Leonarda e Gustavo, então, se encontraram na ideia de ficção, como nos diz o diretor: “Ficção que é o que eu pesquiso, é a minha profissão – como drag queen, que é o que eu faço da vida faz 12 anos – e é uma necessidade básica de qualquer ser humano. Básica como fazer xixi, cocô, comer, tomar água, dormir. Humano prescinde de ficção pra viver, e em diferentes medidas, com diferentes graus de comprometimento e de risco, todo mundo vai dando um jeito de concretizar”.
A ideia de ficção que move a criação reflete-se, em todos os recursos técnicos utilizados na montagem: seja na criação em videoprojeções de Ricardo Kenji ou na trilha original desenvolvida por Jo Mistinguett, estas camadas ficcionais são construídas e destruídas em cena. O mesmo acontece nos figurinos assinados por Fabianna Pescara e Renata Skrobot e no desenho de luz de Wagner Antônio, que cumprem a função de revelar e ocultar alguns dos signos explorados na montagem.
Para Gustavo, o ponto chave da ideia de ficção explorada no trabalho encontra-se no fato de que “algumas ficções são permitidas e outras não. Quando se trata de gênero, as pessoas tendem a ficar muito assustadas”. TRAVA BRUTA desloca o seu olhar para um dos principais dilemas culturais, políticos e sociais de hoje: a ideia da diversidade. Neste caso, ela se refere muito mais ao lugar ocupado pelas pessoas trans na sociedade brasileira e mundial. Leonarda é enfática: “Chego aqui com a certeza de que o herói macho branco, heterossexual, cristão e suas ideias precisam urgentemente ser substituídos, trocados ou mesmo revisitados por outros ângulos. Estão chatos. De alguns eu ainda gosto muito, mas estão chatos.”
Esta primeira temporada presencial será realizada entre os dias 7 e 12 de dezembro, de terça a sábado às 21h e domingo às 20h. Os ingressos variam de R$15,00 a R$30,00 e haverá, em todas as apresentações, uma cota de ingressos gratuitos para pessoas trans, que poderá ser retirada presencialmente, uma hora antes do espetáculo.
SERVIÇO: TRAVA BRUTA
Temporada presencial.
Centro Cultural São Paulo – Sala Jardel Filho
Rua Vergueiro, 1000 – Paraíso, São Paulo
Temporada: 7 a 12 de dezembro
Horários: Terça a sábado, 21h e domingo 20h.
Ingressos: R$30,00 (inteira) e R$15,00 (meia-entrada)
Bilheteria abre uma hora antes do espetáculo ou antecipado pelo link Sympla
Classificação: 18 anos
Duração: 60 minutos
Jaqueline Gomes
Jornalista graduada pela Universidade Nove de Julho com Pós em Marketing Digital Estratégico pela PUC-SP, é especialista em Jornalismo Cultural, Assessoria de Imprensa e Mídias Sociais. Trabalha na área de comunicação desde 2010. Fundadora do Site Acesso Cultural, sempre quis desenvolver um veículo onde pudesse noticiar o que acontece de novidade no meio do entretenimento cultural. Apaixonada por shows de rock, livros, filmes, séries e animais.