Resenha: A Espiã de Paulo Coelho




O livro “A Espiã”, de Paulo Coelho, foi lançado no Brasil pela editora Paralela, e marca a estreia do escritor como capista

Por colaborador Lucas Damasio

Reprodução / Internet

Ser mulher deve exigir mais força do que os homens podem imaginar. As lutas constantes dos dias atuais em uma sociedade formada pelo pensamento machista evidenciam a necessidade de se fazer frente nas batalhas em benefício da igualdade dos gêneros sob os aspectos sociais, profissionais e culturais e demonstram o quanto estamos longe de uma linha de pensamento mais coerente e que afaste a loucura da diferenciação e definição da capacidade das pessoas pelo sexo.

Se em pleno 2017 essa luta ainda encontra enorme resistência e a idealização da figura da mulher independente, forte e segura, de pensamento e valores próprios ainda causa incomodo e não se aprofundou socialmente ao ponto de mudar alguns comportamentos e visões pré-estabelecidas, imagina o contexto disso tudo no final dos anos 1800 e inicio dos anos 1900.
Foi nesse cenário que Mata Hari, pseudômino de Margaretha Gertruida Zelle, viveu. A figura dessa mulher aguçou a curiosidade de historiadores, escritores, pesquisadores e estudiosos da primeira guerra mundial. Ela foi morta, condenada por fuzilamento em 1917, acusada de espionagem, embora as provas e argumentos de acusação apresentados em seu julgamento tenham sido questionados desde a época de sua execução.

Mata Hari foi uma dançarina exótica que fez sucesso em Paris, cidade que amava, e lá permaneceu até o inicio da grande guerra. Ela foi conhecida – e rotulada – por dormir com diversos oficiais, de ambos os lados da batalha, por ter pensamento próprio e fazer questão de se demonstrar como uma figura de grande força e independência, o que despertava o desejo dos homens e a inveja das mulheres. Essa é a personalidade que Paulo Coelho empresta à sua personagem ao narrar o pensamento de Mata Hari por meio de suas cartas, que essencialmente falam sobre o que era ser uma mulher que lutava pela independência naquela época, sem deixar de lado seus caprichos e desejos.

Reprodução / Internet

O livro “A Espiã” tem inicio com a execução da acusada, noticiada em carta por um oficial francês responsável pela sua prisão e guarda. Às páginas seguintes são narradas pela própria personagem por meio de suas cartas, descrevendo a sua infância, os abusos sofridos, a morte da mãe e o casamento infernal pela qual passou, até chegar a Paris e viver o auge de sua vida. Ela ainda fala do seu relacionamento com os diversos homens que teve, e como, em sua visão, a manipularam – ou manipularam a sua imagem de mulher forte – até conseguirem classificá-la como uma espiã perigosa que poderia prejudicar toda a guerra em benéfico dos alemães. Mas seu único crime foi, segundo Paulo Coelho, ter a coragem de ser uma mulher com opiniões e vontades próprias, e não se dobrar aos valores distorcidos de sua época, que sujeitavam as mulheres às vontades e moldes estipulados pelos homens.

Um dos pontos interessantes da obra parece ser a mudança sutil no estilo de escrita de Coelho, focando menos a narrativa em contextos espirituais maiores – como são característicos em toda a sua obra – e dando vazão aos pensamentos da personagem principal sobre o valor de suas escolhas e como elas se tornaram a fonte das consequências que teve de enfrentar a partir do momento em que decidiu viver como Mata Hari, direcionando a reflexão do leitor não aos aspectos espirituais que nos formam, mas aos conceitos culturais da sociedade, especialmente sobre a figura da mulher, e como a diferença dos gêneros pode estimular atos injustos e inescrupulosos que são, à sombra de um inconsciente coletivo que ninguém se preocupa questionar, valores degradantes que impregnam a formação social contemporânea. Claro que isso não é uma verdade absoluta, mas só uma percepção minha sobre a obra do escritor.

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