Crítica: Desajustados (Fúsi, 2015)




Por Gabriel Antoniolli


A primeira cena do trailer de Desajustados (Fúsi, 2015) chama a atenção, ao menos um pouco, pelas premiações alcançadas pela obra do diretor Dagur Kári (Dark Horse, Um Bom Coração). 

Fonte da imagem: Divulgação – Imovision (YouTube)

Fúsi (Gunnar Jónsson) é um homem de 43 anos que ainda mora com seus pais e, sinceramente, logo no começo você percebe que, se dependesse dele, moraria para sempre.

Foto: Divulgação – Imovision (YouTube)

A comodidade, inclusive, é uma de suas maiores características. Por que pedir outro prato no restaurante se eu gosto do único que eu conheço? 

Foto: Divulgação – Imovision (YouTube)

Percebendo isso, seu padrasto consegue um pacote de aulas de dança para que ele aprenda a interagir e dar uma integrada com o pessoal, se soltar um pouco, essas coisas. Claro que Fúsi achou a maior bobagem sair de sua zona de conforto que ele vinha há tanto tempo cultivando. Contudo, ele passa a perceber que algumas atitudes podem valer a pena.

Nos vemos em um mundo sob a perspectiva de alguém que está conhecendo a vida a partir dos 40. Ele se vê até mesmo em relações de amor e amizade e começa a adentrar o mundo de conflitos das relações interpessoais. Boas, ótimas… mas precisam de atenção, né? 
Precisam. Foto Divulgação – Imovision (YouTube)

É notada em Desajustados a ruptura de uma rotina que aparentemente não era quebrada há anos. Há muita emoção envolvida no sensível e gentil drama escandinavo (as gravações foram na Islândia). Também premiada no 14º Festival de Tribeca, a escolha do ator Gunnar Jónsson foi perfeita e sua interpretação foi tão sutil que fica até difícil imaginar que Jónsson não é Fúsi.

A fotografia nórdica é melancólica e se mistura bem ao roteiro e à trilha, romântica e ansiosa. Aqueles acordes simples que nunca têm fim e que começam calmos e terminam agoniantes.

MOMENTO TENSO. Foto: IMDB

Talvez Fúsi seja a inspiração necessária para quem precisa sair um pouco da zona de conforto e enfrentar desafios que precisam de um empurrãozinho de ninguém menos do que si próprio. 

Desajustados já está em exibição nos cinemas brasileiros!

Outros Comentários:
– Tenho gostado que os protagonistas têm cedido cada vez mais seus nomes aos títulos dos filmes. Uma pena que perdem-se com a tradução.
– O pôster me conquistou no momento em que o vi.
O pôster. Foto: Divulgação – Assessoria de Imprensa

Crítica: Hardcore – Missão Extrema (Hardcore Henry)




Por Gabriel Antoniolli

Eu não sou fã de filmes de ação, mas tentei ir sem expectativas para Hardcore – Missão Extrema (Hardcore Henry, 2015) e valeu a pena. Valeu demais!

Foto: Divulgação

É uma ação diferente de tudo o que você já viu no cinema. Sabe aqueles filmes de terror com a câmera na mão? Então, esse é “câmera nos olhos”, e a gente acompanha tudo o que o protagonista vê, como se estivéssemos em seu corpo. 

Isso em um filme sem censura. 

É, rapaz. (foto: STX Entertainment)

O estilo da produção inovadora da Diamond Filmes lembra clipes de Swedish House Mafia e Prodigy, mas nos remete ainda mais a jogos de ação em primeira pessoa. 

96 minutos assim. (foto: STX Entertainment)
O diretor russo Ilya Naishuller nos envolve em uma atmosfera cheia de adrenalina desde o início. O enredo nos faz querer ver mais: o protagonista é Henry, um ciborgue que ressuscita sabe-se lá como e que precisa, primeiramente, descobrir mais sobre si. Só que antes mesmo de ter seu pacote de fala instalado, sua esposa é sequestrada por mercenários russos. É nesse contexto que o espectador é convidado para adentrar ao universo de Hardcore – Missão Extrema.

O filme é inteiramente vacinado contra o tédio e a todo o momento você se verá em meio a alguma briga ou correria. A melhor parte (para o espectador) é que Henry é bem disposto e sempre está correndo ou pulando, dando animação à obra. Isso faz muita diferença.


Depois que rola a briga inicial que culmina no sequestro da mulher de Henry, o ciborgue se vê em meio a uma batalha contra o vilão Akan, que comanda os mercenários e que ainda possui poderes telecinéticos. Para piorar e sem ainda se conhecer totalmente, Henry sofre com descargas de bateria.

Deve ter doído (foto: STX Entertainment)

O título diz bastante sobre a obra. É hardcore e é extremo. Possui cenas pesadas de violência que se tornam ainda mais reais pelo estilo do filme. Vá assistir sem ressalvas e preparado para ver tiros, perfurações e muito sangue.

Outro ponto bacana é ver que, mesmo sendo um filme, a preocupação com os detalhes em primeira pessoa é tão grande que por vezes Henry se pega confuso em relação ao que fazer, ao melhor caminho a se tomar, à melhor forma de se entrar em algum lugar. Conseguimos nos colocar no lugar do androide (por mais bizarro que isso pareça) e pensarmos “eu também faria isso”. 

Se divirtam com a trilha sonora. Ela é colocada de uma forma por vezes sarcástica, evocando até mesmo Queen em um tiroteio. As canções embalam e divertem, tirando o peso invisível que nos esmaga o tempo todo – afinal, vemos tudo pelos olhos de Henry. Somos o personagem, praticamente.

A experiência foi ótima. Hardcore – Missão Extrema revela um estilo que pode se tornar tendência. Claro que a atuação dos atores Sharlto Copley (Distrito 9), Haley Bennett (Letra e Música), Tim Roth (Os Oito Odiados e Pulp Fiction, pra citar 2 que gosto) e Danila Kozlovsky (que manda muito como vilão) faz muita diferença.

Haley Bennett na mira de um dos muitos mercenários russos do filme. (foto: divulgação)

Um bom comentário que ouvi a respeito do filme foi justamente o último antes de o filme começar: “não se vê nada tão diferente nos cinemas desde Borat”. Não mesmo. 

Hardcore – Missão Extrema ainda não tem data de estreia nos cinemas brasileiros, mas a expectativa é que seja em abril de 2016.

CRÍTICA: A LINGUAGEM DO CORAÇÃO




Por Gabriel Antoniolli

Os campos franceses do século XIX guardavam mais do que belas paisagens: belos corações. E o da irmã Marguerite (Isabelle Carré) fez toda a diferença na vida da menina Marie (Ariana Rivoire), em drama baseado em uma história real e dirigido por Jean-Pierre Améris no filme “A Linguagem do Coração” (Marie Heurtin, 2014).
As coisas parecem complicadas no começo: Marie nasceu cega e surda. Aos 14 anos, seus pais decidem manda-la para o Instituto Larnay, mas havia um problema: o instituto era especializado apenas em surdez. As freiras ali possuíam as habilidades de auxiliar na adaptação de meninas por meio da linguagem de sinais, mas a cegueira (ainda mais desde o nascimento) era algo novo.

Uma das irmãs havia se apegado bastante a Marie e propôs que ela ficasse sob seus cuidados. “Não sei explicar”, dizia. Após a insistência, é permitida pela Madre Superiora. E ela vai.

Fotos: Divulgação

O passo-a-passo é bem detalhado no filme e é possível perceber a força de vontade e a esperança que Marguerite nunca deixou de ter. Marie não era uma pessoa tão fácil de lidar, o que é facilmente compreensível quando se dá conta de que ela nunca enxergou ou ouviu. Não sabe ou entende o que há ao seu redor. Sequer deve ter se visto alguma vez.

Não são todos que estão ligados com a linguagem dos sinais. Ela é um instrumento que se mostra perfeito se tratando de inclusão e de liberdade, abrindo portas para o trabalho cognitivo. 

Aproveite a trilha sonora. A música clássica dita o tom do filme com leveza e personalidade, garantindo que fiquemos no mesmo impasse que Marguerite e, ao mesmo tempo, com a ingenuidade de Marie. 

Aproveite também a fotografia. Os campos franceses são maravilhosos e há algumas belas cenas neles. Nada tão estupendo como paisagem, mas pequenos mundos particulares entre uma árvore e outra. 

Com uma atuação incrível da jovem Ariana Rivoire ao lado de Isabelle Carré, “A Linguagem do Coração” estreia nos cinemas brasileiros em 17 de março após ter aparecido entre os vencedores do Festival Internacional de Cinema de Locarno. Confira abaixo o trailer: