Montagem inédita traz aos palcos de São Paulo a sombria história da estranha Carrie White
Por Walace Toledo
Sabe aquele filme que narra a história de uma estranha garota com poderes paranormais, que após uma péssima brincadeira dos ‘colegas’ no baile do colégio perde o controle e transforma a festa em uma vingança sanguinária? Pois é, a perturbada Carrie sairá da sessão noturna da TV para os palcos do Teatro Augusta, durante todas as quartas-feiras de junho.
“Cia Vozes da Cidade” apresenta “Carrie – O musical”, adaptação da obra de Stephen King “A estranha” – libreto de Lawrence D. Cohen, letras de Dean Pitchford e músicas de Michael Gore – conta a história da peculiar adolescente Carrie White (as gêmeas Mariana e Marília Nunes dividem o papel) que descobre seus poderes telecinéticos.
“Um dia serei alguém especial. Um dia serei apenas normal.” – trecho do número de abertura “In”
Carrie é uma garota extremamente tímida que, apesar de seus esforços para se encaixar, é vítima das piadas cruéis de seus colegas de escola e é perseguida por Cris (Ana Catharina de Oliveira) e seu estúpido namorado Billy (Henrique de Paula). Em casa é oprimida pela mãe Margareth (Luciana Artusi), que além de superprotetora é fanática religiosa. Porém, a jovem Sue Snell (Nathalia Borges) consegue ver em Carrie um ser humano frágil e coagido.
Para compensar a maldade de seus colegas e os conflitos com a mãe, Sue convence seu namorado Tommy (Caio Silveira) a levar Carrie ao baile do colégio em vez dela. O filme homônimo imortalizou a personagem na cena onde Carrie, após ser eleita rainha do baile, é vítima de uma enrascada, leva um banho de sangue e, transtornada, causa uma onda de destruição e mortes.
A trama do espetáculo se desenvolve em um paralelo entre o subconsciente de Sue e a narração dos fatos ocorridos na macabra noite de 28 de maio na escola da pequena cidade de Chamberlain.
LIVRO X CINEMA X BROADWAY
“Carrie, a estranha” (1974) foi a obra epistolar do mestre do horror Stephen King. Vista como emblemática, a primeira versão cinematográfica ganhou as telas pelas mãos do diretor Brian de Palma, em 1977, com Sissy Spacek e Jonh Travolta. Mais dois remakes foram lançados em 2002 e 2013.
A adaptação para o teatro musical da Broadway ocorreu em 1988. Orçado em oito milhões de dólares, o espetáculo foi um fracasso de bilheteria e críticas pesadas, fechando as portas muito antes do planejado. Passaram-se muitos anos até os criadores autorizarem pedidos de diretores e companhias para novas montagens do espetáculo. Um revival off-Broadway de 2012 trouxe “Carrie” das cinzas e conseguiu uma aceitação melhor, porém não um sucesso.
POR TRÁS DO MASSACRE
Confira com exclusividade nosso bate-papo sobre os bastidores do musical com as protagonistas e os diretores artístico e cênico!
MARIANA & MARÍLIA NUNES (CARRIE WHITE)
As gêmeas Mariana e Marília respectivamente
Acesso Cultural – Já conheciam a obra de Stephen King e os filmes de “Carrie – A estranha”? A história atraiu vocês para o projeto?
Mariana: O livro eu ainda não conhecia, mas sempre fui muito fã dos filmes! Principalmente o de 2002. É bizarro, mesmo assim eu e a Lila (Marília) adorávamos assistir quando éramos novinhas. Então quando vimos que havia um musical e seria montado no Brasil, quase surtamos!
Marília: Já conhecia os filmes sim. Assisti o remake de 2002 na TV quando tinha uns 12 anos. Lembro que morri de medo e adorei! Aquela Carrie era assustadora demais. Depois de uns anos eu assisti o original, que também me deu bastante medo! Lembro que na época das audições pro musical, o filme mais recente começou a passar diariamente na TV a cabo. Eu assistia quase três vezes por semana e via como as canções do musical são bastante baseadas nos textos dos filmes, ou seja, no livro mesmo. Eu não conhecia o livro na época, mas já sabia da existência do espetáculo.
AC – Como ocorreu a escolha dupla para o papel da protagonista?
Mariana: Fizemos a audição com várias outras “Carries” e ficamos muito felizes quando descobrimos que dividiríamos o papel e que o fato de sermos gêmeas seria usado na peça.
Marília: Já tínhamos imaginado que pra um espetáculo com alguns efeitos especiais, ter atrizes gêmeas poderia ser um bônus. Estudamos bastante e tivemos o prazer de sermos escolhidas.
AC – Qual a maior dificuldade que vocês encontraram para interpretar Carrie White? Conte-nos sobre o processo de construção da personagem.
Mariana: Tive muita dificuldade de encontrar a Carrie em mim. Considero-me tímida, mas uma “tímida” diferente da personagem. Sessenta por cento das cenas eu passo olhando para o chão (risos). A interação com os outros personagens também foi bem complicada. Sou amiga deles e em cena quase ninguém é meu amigo… nem minha mãe (risos)! No geral foi uma delícia.
Marília: Carrie é uma menina bem tímida e introvertida. Eu também tenho essas características, o que pra mim foi uma vantagem e uma desvantagem, porque a timidez dela tem uma profundidade e um significado muito diferente da minha. A Carrie é uma personagem complexa, que tem dentro de si um pouco do próprio pensamento, um pouco do pensamento da mãe e um pouco do pensamento dos “colegas” de escola. Essa complexidade foi com certeza o maior desafio.
AC – Dividir o papel com a irmã é mais fácil ou mais difícil?
Mariana: Boa pergunta! É delicioso e torna o processo um pouco menos cansativo, mas somos uma Carrie. E apesar de sermos gêmeas idênticas, nossas formas de cantar, movimentar e dar o texto são diferentes. Tentamos aproximar ao máximo.
Marília: Pra mim foi bem fácil e gostoso! Já fizemos muitas peças juntas, entretanto nunca tínhamos dividido o mesmo papel. Essa experiência está sendo boa, porque além de aprender assistindo o trabalho dela, podemos estudar juntas e ajudar uma a outra quando estamos em casa. Ela é minha maior companheira. Foi realmente uma honra dividir um papel com ela.
AC – Para finalizar… Carrie White tem o poder da telecinese. Se vocês pudessem escolher um poder paranormal, qual seria?
Mariana: Poder ler os pensamentos de algumas pessoas seria legal às vezes (risos).
Marília: Essa é difícil! Mas acho que se eu pudesse escolher um poder paranormal, eu escolheria o teletransporte. Pensei em invisibilidade, em ler os pensamentos das pessoas, mas acho que esses seriam invasivos demais e acabariam causando muita confusão. Então, acho que o teletransporte me faria bem feliz!
ROBERTO DONADELLI (DIRETOR ARTÍSTICO)
Acesso Cultural – Um musical de suspense/terror é um projeto ousado, além disso, “Carrie” não teve o sucesso esperado na primeira montagem Broadway, e a segunda off-Broadway foi razoavelmente melhor. Como surgiu a preferência da Cia. Vozes da Cidade pela montagem de “Carrie – o musical”?
Roberto: Nós fizemos alguns encontros e nos pusemos a escutar e assistir vídeos de todos os musicais que já ouvimos falar. Inicialmente, queríamos montar “We Will Rock You”, mas quando escutamos a musica “IN”, que abre “Carrie”, tivemos certeza que estávamos com um material muito interessante nas mãos. “Carrie” é o tipo de musical em que o espectador não prega os olhos um minuto. Ao contrário do filme, o musical vai mais pra uma linha de suspense do que terror. Outros personagens aqui têm mais destaque e a trama é mais parecida ao livro de Stephen King.
A versão Broadway não fez sucesso porque os filmes anteriores a ela seguiam uma linha meio “trash”. Não que não fossem bons – tanto que ajudaram a imortalizar a personagem – porém, de uma forma geral, não eram um “GREASE” da vida. E realmente, algumas das escolhas na concepção do musical original foram quase tão trágicas quanto a própria história da Carrie. Na versão de 2012 esses defeitos foram corrigidos e eles fizeram uma temporada modesta, mas que serviu pra lavar a reputação do espetáculo e devolvê-lo ao seu lugar. Nossa versão é autorizada aos moldes do musical de 2012.
AC – Quando um musical tem um filme bem conhecido (neste caso 3), o público tem essas referências na cabeça, às vezes nem sabendo que o roteiro é adaptação de um livro. O que o público pode esperar desta montagem entre a obra de Stephen King e os filmes?
R: No musical a própria personagem central é mais parecida com a Carrie do livro de Stephen King do que a garota desengonçada e com problemas fonéticos dos dois primeiros filmes. No terceiro filme eu acho que a Carrie parece ser uma pessoa que de diferente só tem a mãe fanática e seus poderes paranormais. Na nossa montagem ela também é diferente. O trabalho cênico das gêmeas foi realizado de modo a fazer delas uma nova versão de Carrie: uma versão com a cara de uma “Carrie brasileira”. O espetáculo segue um roteiro que trará a memória muitas cenas do filme, mas também inclui momentos semelhantes ao livro e outros que foram adaptados especialmente para os palcos.
AC – Qual foi o maior desafio que você destacaria?
R: Colocar a produção em pé e levá-la para o teatro sem ter nenhum apoiador ou patrocinador. Nós contamos apenas com as doações provenientes de amigos através dos portais VAKINHA e CATARSE. Isto sem dúvida é o maior desafio, pois afeta todos os outros aspectos do espetáculo.
OBS: Se você quiser apoiar financeiramente a produção do musical, clique: VAKINHA ou CATARSE.
AC – Desde o início do projeto estava nos planos encontrar gêmeas para interpretar Carrie White? Seria uma regra pela da praticidade cênica? Foi difícil encontrá-las?
R: Absolutamente não. Acho que somos a primeira produção de “Carrie” no mundo que tem a oportunidade de utilizar gêmeas. Lembro-me de ficar tremendamente confuso nas audições, pois tinha dúvidas de quem era quem nos vídeos que fizemos de registro. Eu as conhecia de outros projetos e já sabia o talento delas – aliás, elas são nomes muito promissores para o teatro musical brasileiro! Foi tudo uma questão de sorte, ambas audicionarem e aceitarem participar do projeto.
AC – Mesmo muito jovem você já é um veterano dos palcos, como é estar nos bastidores como diretor artístico e tradutor/versionista?
R: Eu sempre gostei de fazer versões musicais e traduções das minhas canções preferidas. Já tive oportunidade de fazer isso anteriormente para a “Cia Vozes da Cidade” e em outros projetos. É muito legal ver canções estrangeiras tomarem forma na sua língua. E a direção artística é mais um “título” que encontramos pra definir o meu papel na Cia.: dar opinião em tudo e supervisionar o projeto, uma vez que estou morando em Dubai atualmente e não poderia me fazer mais presente no projeto. Mas, meu coração está nos palcos e por mais que dirigir seja uma experiência muito interessante, estar do outro lado e poder contar a história ainda é minha parte preferida do trabalho.
AC – O libreto foi seguido à risca ou pôde ter alguma alteração artística autorizada que você achou pertinente?
R: Quando adquirimos a licença do musical tivemos que assinar um termo em que nos responsabilizamos a não alterar o espetáculo. As alterações permitidas são somente nos aspectos de produção (cenário/figurino/luz). A obra musical tem de ser executada exatamente como foi escrita e as versões em português podem conter outras palavras, mas precisam manter o sentido original do que foi escrito. Após finalizadas tradução e versões musicais é preciso traduzir literalmente a tradução feita e enviar para os detentores dos direitos, para que eles avaliem se o sentido original das ideias foi mantido. É um tremendo trabalho!
SÉRGIO MARQUES (DIRETOR CÊNICO)
Acesso Cultural – Como é trabalhar com gêmeas dividindo em cena o papel de Carrie White? A praticidade cênica deve ajudar muito, mas qual foi o maior desafio?
Sérgio: Trabalhar com duas atrizes no mesmo papel é algo que enriquece muito o processo, pois é possível ter duas interpretações sobre a mesma personagem. Cada uma tem a sua vivência e sensibilidade pra se aproximar da personagem, e no nosso processo surgiram duas Carries, uma mais tímida e inocente, e outra menos frágil e mais inconformada com a própria situação. Claro que todas essas características existem dentro dessa personagem, a questão é que cada atriz se apropriou melhor de um lado dela. O grande desafio foi entender qual face da Carrie aparecia mais em cada cena, de modo que pudéssemos decidir qual dessas nuances se adequaria às situações.
AC – Sendo um musical de suspense/terror, com mortes, muito sangue e tensão, como é para o diretor cênico coordenar elenco e parte técnica para passar veracidade ao público sem cair na caricatura?
S: O elenco passou por um longo processo de entendimento do espetáculo. Como nossas produções não têm fins lucrativos e por finalidade a pesquisa em teatro, não trabalhamos na lógica do mercado teatral, que geralmente busca um processo de produção rápido – de um a dois meses – nós tivemos cerca de 8 meses. Na primeira fase, discutimos o tom da peça, como nos aproximar dessa história, os atores investigaram o tônus das personagens etc. Foi um processo de apropriação da narrativa e decodificação dessa “tragédia contemporânea” no corpo de cada ator. Quanto aos efeitos, no material que recebemos ao comprar os direitos, o autor já coloca diversos desafios que a produção original enfrentou no que se refere ao uso do sangue líquido e aos poderes telecinéticos da Carrie. Então, baseados nesses sábios “conselhos” do autor, mantivemos algumas das soluções dadas na produção off-Broadway de 2012, e criamos alguns efeitos com a ajuda do elenco e dos nossos diretores artísticos, Caio Silveira e Roberto Donadelli, que são excelentes em propor soluções que dão ótimos efeitos e se encaixam na estrutura e orçamento.
AC – Ocorreram ensaios dentro de uma escola de verdade, esta experiência foi pensada desde o início para o elenco entrar no clima? Qual a importância?
S: O espaço da escola nos foi cedido para ensaiar desde o nosso último espetáculo “Canção do Coração”. Eles apoiam o trabalho da Companhia desde sempre. Claro que quando escolheram montar “Carrie”, os diretores artísticos logo me pediram para que eu propusesse dinâmicas para que o elenco conseguisse se colocar em situação e fazer uso da atmosfera do ambiente para entender as relações entre essas personagens. Tivemos diversas dinâmicas, como jogar vôlei na quadra e passar por “aulas de educação física” dadas pela atriz que vive a Professora Gardner. Aconteciam algumas dinâmicas inconscientes também, por exemplo, quando o elenco se reunia na sala de música para aprender as linhas vocais e eu os pegava sentados nas carteiras escolares dispersos, fazendo piadinhas etc, um verdadeiro laboratório.
AC – A cena mais aguardada de quem conhece a história de “Carrie – A estranha” é a carnificina no baile. Pode nos adiantar o que os amantes da obra de Stephen King e dos filmes podem esperar?
S: Essa cena com certeza é uma das mais desafiadoras do espetáculo! Era consenso para a produção que essa seria a cena que não poderia dar errado de jeito nenhum, então as direções cênica, musical e de movimento se engajaram para que isso acontecesse. Claro que não temos os efeitos e a magia do cinema, mas o musical propõe que nessa cena entendamos toda a trajetória da personagem até aquele momento para que ela se entregue a esse estado de ira e vingança. Seguimos um pouco do que propõe a produção off-Broadway e também propusemos algumas soluções para potencializar esse momento. Estamos ansiosos para mostrar isso ao público!
AC – Agora como curiosidade, geralmente em montagens ou gravações sobre assuntos paranormais / de terror a equipe sempre relata algo misterioso que aconteceu durante o processo de produção, como ver vultos, objetos caindo etc. Vocês tiveram algum momento estranho que pode contar para nosso leitores?
S: Com certeza! O elenco até brinca com isso, pois em muitos momentos durante os ensaios luzes piscavam, às vezes portas batiam e alguém logo falava “Carrie?”. A escola em que ensaiamos é bem grande, e muitas vezes ensaiávamos à noite, então claro que víamos vultos, sentíamos que algo nos observava do escuro, entre outros casos. Claro, pode ser apenas algo da nossa cabeça, ou não…
A montagem da Cia Vozes da Cidade conta com um elenco de 17 atores sob a direção cênica de Sergio Marques, direção musical de Caio Silveira e Thiago Dutra, coreografias de Ana Catharina de Oliveira e direção Artística de Roberto Donadelli; e ainda com uma orquestra que executará todas as canções do espetáculo ao vivo, sob a regência de Thiago Dutra. Alex Reis, Gabi Gatti, Gabi Smurro, Ina Mello, Isadora Santana, Jessica Mattoso, Joel Capelo, Marcos Vinícius Rinaldi, Mateus Torres, Rachel D’Alessandro e Thiago Perticarrari completam o elenco.
SERVIÇO
Local: Teatro Augusta (Sala Paulo Goulart) – Rua Augusta, 943, Cerqueira César – São Paulo / SP
Capacidade: 302 lugares
Dia e Horário: Quartas-feiras – 03, 10, 17 e 24 de Junho de 2015 – às 21h
Valores: R$50 (inteira) e R$25 (meia e promoções – flyer desconto abaixo)
PROMOÇÃO: Imprima ou mostre a imagem abaixo no celular na hora da compra na bilheteria do teatro e ganhe 50% de desconto no ingresso.